"Pierre escutou bem aquelas palavras. Era pouco ou quase nada sociável, e as aulas haviam começado poucas semanas antes, não havendo tempo e nem ambientação suficientes para o enlace de novas amizades.
Entretanto, Júlia não passava despercebida aos olhares do jovem retraído. Seu porte elegante e destemido, contrastando com seus adornos singelos; sua voz firme e seus cabelos longos, lisos e amendoados desenhavam uma beleza imponente. Sua presença não fazia figuração por onde passava, deixando marcas através de seu olhar sincero e questionador.
Os poucos dias dividindo o mesmo ambiente foram cabais para construir quase uma necessidade, solidificando o desejo que se perpetuaria por anos. Pierre adentrava a sala como uma águia à procura de sua presa. Ansiava por alguns instantes de admiração da linda jovem de pele clara e traços notáveis e singulares; que se sentava na segunda carteira do lado esquerdo; que prendia os cabelos sempre com a mesma presilha de madeira, pouco depois de colocar sua bolsa no chão; que limpava as lentes dos óculos com a barra da blusa, permitindo que Pierre vislumbrasse, ainda que furtivamente, os leves movimentos de contração do ventre da estudante.
Não havia expectativas de um encontro amoroso. Nem mesmo um preparo mental para tal encontro, ainda que imaginário. Pierre a olhava, escutava, acompanhava sua dança corporal em cada gesto, e assim se satisfazia."